Há dias vi o documentário do Martin Bashir sobre o Michael Jackson e posso dizer que foi uma das coisas mais perturbantes que vi nos últimos tempos. Senti-me incomodado. Mesmo incomodado. Não sou um fã do Michael Jackson e nunca gostei muito dele como pessoa, mas não é preciso ser fã para ficar indignado com a violência psicológica implícita na entrevista.
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Nunca tinha visto o MJ em entrevista e chocou-me perceber que ele era apenas um miúdo. Não é preciso ser-se muito inteligente para perceber que aquele homem não teria mais de 9/10 anos de idade mental. Isso afligiu-me. Tudo o que se diga e pense sobre o MJ não pode ser dissociado deste facto. É uma pessoa emocionalmente deficiente. Não é um adulto. É um míudo num corpo de adulto. A relação dele com tudo o que o rodeia é assombrosamente infantil. Dinheiro, corpo/imagem, família, filhos, negócios...
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Se ele não tivesse sido um talento musical exemplar (goste-se ou não) teria sido tratado de outra forma. A realidade é que, como a maioria das crianças, ele não era autónomo e para seu mal era extremamente rico e com capacidade de produzir riqueza. Um alvo muito fácil para aqueles que querem fazer dinheiro também fácil.
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Já experimentaram deixar uma criança vestir-se sozinha, alimentar-se sozinha, dar-lhe rios de dinheiro para que ela o administre? Penso que o resultado é, na maioria dos casos desastroso. Os pais ou as pessoas responsáveis pela criança não a deixam cometer uma série de disparates. Mas quando a criança tem 26 anos e responsabilidade civil, as coisas mudam. Toda a gente que puder tirar partido disso tira.
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Se um dia virem o documentário de que falei tentem imaginar que o MJ é um miúdo de 10 anos. Nessa circunstância, a conversa dele não parece disparatada, a atitude dele a fazer compras numa loja (tal qual uma criança numa loja de brinquedos) não surpreende, a forma como toma conta dos filhos e dá o biberão ao mais pequeno é equivalente à de um miúdo assustado a quem os pais obrigaram a tomar conta dos irmãos bebés. O MJ era um ser imaturo do ponto de vista emocional, psicológico e diria mesmo social. Não sei se nasceu dessa forma, se este estado foi produzido pelos traumas ao longo do seu crescimento.
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Se ele fosse um deficiente sem nenhum talento. Provavelmente estaria numa instituição ou à responsabilidade de alguém. Mas não foi assim. E tornou-se demasiado grande. Deixou de ser a pessoa, para ser a entidade, o mito. Acho que para saber quem ele era tinhamos de fechar os olhos e ouvi-lo apenas. Os olhos podem enganar-nos bastante.
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Quanto ao Martin Bashir, o entrevistador, se o visse na rua acho que o agredia. Porque foi desprezível. É um homem inteligente e apercebeu-se bem do que tinha à frente. Mas a oportunidade de estrelato e de se tornar célebre era imensa, mesmo que isso implicasse a tortura de alguém que é forçado a responder a coisas que não quer encarar, coisas que não compreende na sua lógica e que não tem maturidade para responder.
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Uma vez vi um filme. Em que um advogado, a defender um negro que tinha matado os violadores brancos da sua filha de 9 anos no estado racista do Mississipi, fez um jogo com os jurados todos eles brancos. Descreveu todo o processo da violação e disse «agora imaginem que esta menina era branca». Eu digo-vos o mesmo. Se virem o dito documentário oiçam o MJ a falar, mas imaginem que é um miúdo de 10 anos que está a dar as respostas. Talvez muita coisa faça mais sentido. A linearidade dos nossos olhares é uma coisa lixada.
Eu vi esse documentário e partilho exactamente da tua opinião. O MJ não era de todo uma pessoa normal e aquilo mexeu comigo. A parte em que ele entra numa loja de arte e compra mais de 50% da loja, tal como dizes, "como uma criança numa loja de brinquedos", só por aí vê-se logo que algo não estava bem naquela cabeça. Não fosse o seu talento musical, bem como a equipa por detrás da estrela, e o MJ não era ninguém.
ResponderEliminarVi esse documentário 2 vezes, fiquei com a mesma sensação...uma criança num corpo de um adulto. Uma criança que não teve tempo para crescer. A forma como fala dos filhos, a forma como os trata, a forma como falou das crianças que dormiam na cama dele em Neverland, ele não tinha mesmo a noção daquilo que dizia.
ResponderEliminarMais uma vez, dou-lhe todo o mérito como artista...o resto...quem sou eu para o julgar.
AR
@C.Cruz: Sabes que eu acho que o grande problema dele foi mesmo o tipo de gente que tinha atrás dele, os que formaram essa grande equipa a partir do Thriller. E a família claro.
ResponderEliminarJá tinha lido, mas só agora comento: subscrevo cada palavra.
ResponderEliminarO documentário mexeu muito comigo, mais pela falta de escrúpulos por parte do jornalista, do que pelo estado interior do MJ.
Não há limites para os media, que agora encarnam literalmente o papel de abutres: mesmo depois de morto, toca a vasculhar a sua vida privada, à cata de detalhes sórdidos e bizarros. Chocou-me ver o Deepak Chopra - esse grande "guru" espiritual - a relatar para uma cadeia de TV, à laia de bufo, uma conversa que tinha tido com Jackson, acerca da sua dependência de medicamentos.
No mínimo, deprimente...