Zacarias cresceu sem sorte. A sua vida era um túnel de vento ártico,
todos os dias. Pequeno e mirrado sempre lhe disseram que nunca iria a
lado nenhum e não foi. Ficou ali mesmo. Nunca saiu da casa onde nasceu, a
mesma onde o olhar de resignação dos pais por aquele filho murcho
continuava a escorrer por todas as paredes, penetrando-lhe o esqueleto
enfezado como humidade cortante. Trabalhava no Zoo como tratador de
felinos, por favor do Diretor ao pai e à mãe do Zacarias que ali tinham
trabalhado em vida. De tão magro e feio nem os leões o quereriam comer e
se quisessem, o mundo não perderia grande coisa. Mandava a lei que
andasse sempre com dardos tranquilizantes nas calças, apesar do Diretor
do Zoo preferir que fosse comido para poupar o dinheiro dos dardos. A
vida arrastava-lhe o corpo numa sobrevivência dormente. Sentado no sofá à
espera de ter sono, Zacarias viu cair um papel pela chaminé, «Feliz
Natal» dizia. Tinha-se esquecido que hoje era dia 24 de Dezembro. Ouviu a
campainha. «O Pai Natal» pensou desinteressado enquanto abria a porta.
Algo o projetou contra a parede da sala, depois o chão. Em 10 segundos
estava de novo no ar pendurado pelo pescoço «onde está o dinheiro
cabrão? Fala ou morres agora!». A mão hercúlea esmagava-lhe a traqueia,
«não tenho» disse com dificuldade. A mão gémea daquela vasculhava-lhe as
calças. Zacarias não conseguia respirar, ia morrer. Caiu no chão… não
ia morrer. O ladrão estava de joelhos, tonto… tombou. «Os dardos»
pensou, «picou-se». Zacarias olhou para o corpo enorme no chão.
Sentou-se em cima dele. Atou-lhe as mãos enormes atrás das costas e
sentiu algo que nunca tinha sentido, uma ereção. Nunca tinha pensado em
homens, sequer em sexo. Pensava-se assexuado, será que não era? Estava
disposto a descobrir. Puxou as calças do ladrão para baixo, subiu-lhe a
camisola até ao pescoço. O corpo dele era magnífico, dorsais vincados,
nádegas esféricas cobertas por uma leve penugem dourada, pernas amplas e
grossas. Desceu-lhe a mão entre as nádegas, sentiu a humidade, as
coxas. A ereção doía-lhe, vulcânica. Tinha de telefonar à polícia.
«Depois» pensou. Foi à cozinha buscar manteiga. Era noite de consoada e
tinha apetite pela primeira vez.
Tive imenso prazer a escrevê-lo, espero que dê o mesmo prazer a quem o lê.
9 comentários:
Já te dei os parabéns no blog do Sad. É uma história do caraças, deu-me tanto gozo lê-la. =)
uma das melhores, quiçá a melhor, entre a tua e a do namorado...
Obrigado! :)
Nem sabia muito bem onde estava a ir. Sabia que queria brincar com um presente inesperado a alguém que não sabia o que era ter um presente. E fluíu assim.
Muito boa! Gostei muito! A melhor até agora e das que li!
Para mim foi o melhor de todos os teus contos Pixel.
Fico à espera de saber o que fazes em poesia. Estou mesmo ansioso por isso :)
abc
Até me vieram perguntar o que se passava, porque o final provocou-me muitas gargalhadas =b
What a surprise!
não concorri desta vez, não tenho tido muito tempo... escapa-me entre os dedos, o tempo!
Ainda não pude ler as outras historias que concorrem!
Mas como te já o disse acerca da ultima historia que concorreste, a qual para mim foi a melhor!
o mesmo digo desta...Muito BEM!!!
Abraço-te
Muito bom.
A melhor.
Tens veia.
como sempre, adoro os teus textos. Mas manteiga!!!! ahahaha
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