Tenho sempre um sentimento de perda muito grande quando vejo morrer um talento. Zango-me mesmo. Há aquela frase batida que diz que todas pessoas são especiais à sua maneira, mas para eu concordar com isto tenho de criar uma nova categoria os supra-especiais. Quando morre um supra-especial sinto que o mundo é mesmo um lugar mais feio. Senti isto quando morreu a Lhasa, senti agora quando morreu o Alexander Mcqueen. Ambos foram pessoas que nos transportaram para lá do conhecido. Há pessoas que não têm medo de sentir, de ver fora das fronteiras estabelecidas e não sendo melhores (ou pirores) que as outras são definitivamente diferentes. Diferentes num sentido expansivo. Expandem-nos, dizem-nos as suas visões e acrescentam-nos.
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É verdade que nem toda a gente quer ser expandido, nem toda a gente quer ver mais do que o conhecido e confortável. Provavelmente a sua especialidade é esta - o conformismo/estagnação. Depois há aqueles que têm medo de olhar para lá do horizonte, mas que se sentem inspirados por estas pessoas magníficas que ousam. Por fim, existem os destemidos, não tantos, que decidem não ter medo de vertigem da viagem e encetam eles próprios o mesmo caminho.
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Lembro-me de quando ouvi a Lhasa pela primeira vez em 1998, «de cara a la pared» era a música, de quando a vi na Aula Magna e de como as palavras se tornavam mais puras, mais belas, simplesmente por percorrer a distância que ia do seu pensamento até à sua boca. Lembro-me desse dia e só me apetece ser meigo, pacífico, justo, puro, beleza... sei lá que mais.
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Lembro-me de quando vi o Alexander McQueen a primeira vez. Penso que era 1997, tinha acabado de apresentar uma colecção e estava a dar no Telejornal. O meu pai (também um self made man) disse-me «o gajo é filho de um taxista». Percebi a admiração do meu pai, por todas as pessoas que trabalham o sucesso a sangue, suor e lágrimas. Eu fiquei fascinado por ver que um homem de aspecto tão normal (camisa manga curta, calça de ganga e botas Doc) tinha tudo aquilo dentro dele. Como todas a pessoas que olham para onde os outros não ousam olhar, foi rejeitado inicialmente, depois foi impossível resistir. Quem não teme pela existência de pessoas brilhantes, quem não se sente ameaçado e antes inspirado, acaba por celebrá-las. O McQueen era perfeito. Iluminou-nos como pouco na sua área de trabalho. A moda ganhou estatuto de arte. Era um artista.
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A Lhasa morreu. O McQueen morreu. Que a minha memória não me traia nunca e que eu seja capaz de identificar a luz, a visão com que nos brindaram, até ao resto dos meus dias.
2 comentários:
Sabes que no caso dele só veio trazer à tona aquilo com que me debato há muito tempo e que as pessoas cada vez mais insistem em vulgarizar, a depressão mata. Lamentável a perda, mas por outro lado bonita e genuína a dor de pessoas que deixam de saber viver sem os que amam, no caso dele a mãe e anteriormente uma grande amiga. Lamento este raciocínio mas acho comovente.
Sim, tens razão. É verdade que ainda se morre por amor.
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