terça-feira, abril 14, 2015

Memórias II - Silvestre mete o pé na poça (à grande)

Resolvi fazer a tese de licenciatura na área de sociologia da família, estávamos em 1997 e eu era dado que era aos temas esquisitos e assim resolvi sugerir à orientadora: o síndrome do ninho vazio (problema enfrentado pelas domésticas depois dos filhos saírem de casa) e as dinâmicas de conjugalidade homossexual. Ela achou por bem eu fazer o segundo por estava desejosa de perceber o que se passava numa relação conjugal que não era orientada pelas determinações sociais do género. 

Meti mãos à obra de forma ambiciosa. Queria lésbicas e homossexuais. Ao fim de meses percebi que as lésbicas viviam numa espécie de bunker escondidas e que tinham medo de qualquer tipo de exposição. Não consegui nem uma entrevista. Fiquei reduzido aos homossexuais masculinos, o que mesmo assim não se revelou fácil. Seria mais fácil se eu dissesse que era gay também, mas eu só era assumido para heterossexuais e para a família (já tinha namorado, mas continuava 3/4 amigos gay e a não querer que mais gays soubessem que eu era gay). 

Numa das entrevistas que me foi conseguida por uma amiga, fui entrevistar um senhor muito simpático à Baixa. Nessa altura o meu conhecimento de Lisboa resumia-se ao Bairro Alto, Universidade e as Docas. Depois de uma hora e tal de conversa e uma excelente entrevista, eu disse-lhe que também gostaria de entrevistar o companheiro dele. Ele respondeu-me que isso não ia ser possível porque o companheiro estava no Alto de São João. E eu continuei «não faz mal eu posso esperar, não tem de ser já. Quando é que ele volta?». Ele olhou-me de forma esquisita, a minha amiga mudou de cor para um vermelho tomate. Eu sem perceber nada e de repente a minha amiga diz-me que o Alto de São João é um cemitério. Aí fui eu que mudei de cor, tive aqueles 3 segundos que parecem uma eternidade, mas ele não se chateou porque percebeu pelo meu ar aflito que foi mesmo desconhecimento da minha parte.  

10 comentários:

Eolo disse...

Acontece... e depois não conseguiste nenhum casal de lésbicas?

silvestre disse...

nenhum. imagina que as pessoas que estavam em casal há 18 anos atrás hoje têm entre 45-65 anos de idade. curiosamente as mulheres eram muito mais armariadas.

silvestre disse...

faço uma adenda. conheço alguns casais de lésbicas (3) que continuam a negar que são um casal, mesmo para os amigos gays. são "amigas". mas cada um sabe de si. acho que tudo é válido desde que se seja feliz e não se faça ninguém infeliz.

JJ disse...

LOOL. Isso seria um comentário também perfeitamente normal para mim, porque o meu conhecimento por Lisboa e arredores também não é famoso.
Nestas alturas faziam mesmo falta um grande buraco, né? ;)

silvestre disse...

@JJ: no mínimo...

silvestre disse...

@JJ: no mínimo...

Lobo disse...

LOLOLOLOLOL Muito bom LOLOL

Também já recebi e-mails para me entrevistarem para trabalhos desse tipo (por causa do blogue), curiosamente na área da sociologia também. Recusei porque implicava entrevista gravada (audio e video) na faculdade. Tive pena, mas há coisas que são demasiado modernas para mim lol

Unknown disse...

Nunca percebi o facto das lésbicas serem tão "armariadas", como dizes.
Do cimo dos meus 42 anos, a verdade é que sou um adolescente no que toca ao mundo homossexuail.
Sou só eu que também sente alguma antipatia das lésbicas pelos gays?

um coelho disse...

Não meteste bem o pé na poça, meteste-te todinho lá dentro!

João Roque disse...

Às vezes apetece que apareça um poço para nos escondermos lá...