segunda-feira, abril 13, 2015

Memórias I - A minha primeira ida ao Trumps

No final de 1993 admiti para mim mesmo que não era bissexual, mas sim homossexual apesar de, até ao momento nunca ter concretizado uma relação sexual com um homem. Os tempos eram diferentes. Ainda não existia Internet e as pessoas que se poderiam conhecer era em locais de engate que eu não frequentava ou na universidade onde conheci os 3 primeiros amigos gay. Tirando um que ainda era mais tanso do que eu, os outros dois eram já batidos na noite e nas discotecas de ambiente. 

Demoraram quase dois meses a convencer-me. No fim de Janeiro de 1994 lá me decidi a ir, mas estava em pânico. Tinha muito medo do que podia acontecer. Estava mais no armário que uma meia esquecida no fundo do guarda-fatos. Os meus amigos adoravam a atenção que recebiam, homens que lhe pagavam bebidas, que queriam sair com eles, que lhes diziam que eles eram os mais giros da discoteca. Isso a mim (que na altura, sim pasme-se, era muito tímido) causava-me transtorno. Queria mais passar despercebido do que outra coisa, poder observar e ver se aquilo me dizia alguma coisa ou se era um contexto que eu deveria evitar. 

Tive a brilhante ideia de andar a comer chocolates durante duas semanas porque eu tinha um acne bera e assim era garantido que ia ficar com borbulhas na cara. No dia da ida, em vez de me colocar no meu melhor, vesti uma camisa castanha e cinzenta bem feiosa e penteei-me com risco ao lado e o cabelo agarrado à cabeça. Não tinha tantas borbulhas como seria de esperar, mas algum acne rebentou. 

Quando entrei no Trumps ia todo a tremer. Na altura aquilo era bastante pequeno e tinha apenas uma escada de acesso à pista onde todos os gajos se encostavam à parede para "micar" melhor quem passava. Parecia um misto de garagem com outra coisa qualquer. Preguei os olhos ao chão e assim passei a noite toda. Não dancei e mantive-me o mais discreto possível pedindo ao namorado do amigo que andava tipo rainha do baile a luzir, que por favor não me deixasse nem para ir à casa de banho. 

Além de ser um sítio feio, o ambiente era muito pesado. Se estavam lá 3 mulheres era muito e os homens olhavam demasiado, chegavam-se demasiado. O namorado do amigo foi um 'compincha' e ficou sempre comigo (inclusive para ir ao WC e ao bar buscar uma bebida) enquanto o amigo andava a mostrar os peitorais e a beber de graça e a distribuir charme pela pista, alto e loiro como só ele sabia ser.

Quando me vi no cacilheiro da manhã rumo à margem sul senti um enorme alívio. A noite tinha acabado e eu não metia mais os pés ali. Ia continuar a ir às discotecas hetero onde podia dançar com as amigas e onde não tinha de me preocupar com o facto de alguém me meter a mão no rabo ou na pila. Comecei a ir ao Frágil. Gostava muito da música e do ambiente misto. Estar em sítios só com homens stressava-me muito. As mulheres davam um ar mais levezinho aos sítios. 

Decidi não meter mais os pés no Trumps. Contudo, em 1996, vi-me lá caído de novo, mas essa foi a segunda vez em que fui ao Trumps e desta vez sem acne.

10 comentários:

No Limite do Oceano disse...

Não te sei dizer se já viu ao Trumps, fui a uma no Bairro alto mas como andava um pouco desnorteado das ideias, saber os nomes dos sítios não era importante. Nunca mais fui lá, foi uma fase, um local diferente (pelo menos para mim) deu para ver algumas coisas :-p

Ricardo - Uma Outra Face disse...

Hahahaha adorei! O medo...

Horatius disse...

Eu nunca fui a um bar/disco gay. E não tenho grande vontade de ir. (a bem dizer, nem gay, nem hetero xD)
Tudo o que vai além de uma bela esplanada no verão, é demais para mim...

silvestre disse...

@ricardo: Acho que ter quase 20 anos em 1994 era diferente de ter 20 anos hoje, pelo menos para um moçoilo da margem sul

Eolo disse...

Woa, throwback monday!

zehtoh disse...

A primeira vez que fui ao trumps foi uns anos depois de ti... mas sou mais novo :P Mas a experiência não andou muito longe da tua. Achei que tinha um ambiente demasiado opressor e os olhos colavam-se em ti assim que entravas a avaliarem-te de cima a baixo. Achei desconfortável e depois dessa vez passaram-se uns anos até que lá voltei. No entretanto descobri o Frágil, que achava mais divertido e descontraído. Mas não, não te andava a seguir :P

Acho que para quem se anda a tentar descobrir o Trumps seria sempre uma experiência "esquisita" ao início... numa fase de dúvidas e afins depararmo-nos com um ambiente (quase) exclusivamente masculino e opressor como aquele era apenas dificultava as coisas, parece-me.

Lobo disse...

1993? Tinha 13. Mas já sabia que gostava do corpo masculino lolol só fui ao trumps em 2007 ou 2008 lololol também tive esse "medo" lolol

Aaron disse...

uhh, gostei da memória e da referência de como era o trumps, tendo em conta que fui lá no fim de semana passado pela minha segunda vez.
já vi que vais continuar a escrever memórias, isso é muito nice! :)
depois leio as próximas.

um coelho disse...

Andar a comer chocolates durante duas semanas para a acne rebentar... muito bom. E não puseste um perfume de cebola e alho naquela noite?

João Roque disse...

Há sempre uma primeira vez...
Fez-me lembrar a primeira vez (há séculos) que fui à "Emília"...